Incidente diplomático à vista: ditadura venezuelana proíbe pouso no país de comitiva de senadores liderada pelo PSDB.
O governo da Venezuela se recusa a autorizar a aterrissagem
de um avião da FAB que levaria uma comitiva de senadores brasileiros a Caracas
na quinta-feira. Pense nisso sem pensar no resto. Esqueça a precariedade da
situação política venezuelana. Pense só nisso. O apoio incondicional do Brasil
a um regime que silencia seus opositores encarcerando-os já era esquisito.
Agora, visto assim, isoladamente, sem explicações, o veto à viagem dos
parlamentares torna esse apoio um escárnio.
Dilma Rousseff pegou em lanças pelo colega venezuelano
Nicolás Maduro na visita que fez a Bruxelas na semana passada. Discursando para
seis dezenas de chefes de Estado na cúpula de países da Europa e da América
Latina, a presidente do Brasil, língua em riste, sapecou: “Rechaçamos a adoção
de quaisquer tipos de sanções contra a Venezuela.”
Decorridos seis dias, o petista Jaques Wagner, ministro da
Defesa de Dilma, repassou ao presidente do Senado, Renan Calheiros, a
constrangedora informação de que o governo companheiro da Venezuela não quer
deixar pousar o avião da FAB que levaria a Caracas, na quinta-feira, uma
comitiva de senadores brasileiros. Procede assim porque sabe que os passageiros
da aeronave vão falar de democracia e pedir a libertação dos opositores que
Maduro mandou encarcerar.
No discurso de Bruxelas, Dilma não se manifestou apenas em
nome dos brasileiros. Soou como se tivesse procuração de um pedaço do globo:
“Nós, países latino-americanos e caribenhos, não admitimos medidas unilaterais,
golpistas e políticas de isolamento”, disse ela. Suprema ironia: mantido o veto
à visita dos senadores, ficará entendido que a Venezuela não precisa de ajuda
externa para se isolar.
Auto-proclamada líder regional, Dilma afirmou que a Unasul
“trabalha arduamente” para restabelecer o diálogo político na Venezuela.
Diálogo? Ora, para um governo que mantém atrás das grades seus antagonistas o
melhor diálogo é aquele em que o outro é obrigado a calar a boca. Ex-presa
política, a presidente brasileira sabe como essa engrenagem roda.
Dilma referiu-se à América Latina como uma “zona de paz”, na
qual “estão consolidados a democracia e o Estado de Direito”. Preso por agentes
da “Inteligência” venezuelana sem um mandado judicial, o prefeito da área
metropolitana de Caracas, Antonio Ledezma, decerto enxerga em seu país outro
tipo de Estado —um Estado de exceção. Em greve de fome há 22 dias, Leopoldo
Lópes, outro oposicionista enjaulado por Maduro, não precisaria torturar as
próprias tripas se os venezuelanos respirassem ares democráticos.
Quando o Paraguai acionou sua Constituição contra o
presidente Fernando Lugo, impedindo-o por 39 votos a 4, num ato soberano do
Senado, o governo brasileiro surtou. Não havia tropas nas ruas de Assunção, a
imprensa paraguaia trabalhava normalmente, o destituído aceitou a
destituição… Tanta normalidade levou o Brasil a comandar a articulação que
enxotou o Paraguai do Mercosul a pontapés. Na mesma época, a Venezuela foi
admitida no grupo. Desde então, o Paraguai teve de ser adulado para retornar ao
clube, e o odor que vem da Venezuela tornou-se lancinante.
Já estava claro que Dilma não tem a intenção de respeitar as
cláusulas democráticas do tratado que rege o funcionamento do Mercosul. Mas a
presidente brasileira poderia ter um pouco mais de apreço por sua própria
biografia. Maduro apodrece aceleradamente. Tapar o nariz já não resolve. A
deterioração exige de Dilma algo mais. Nem que seja uma cara de nojo. (Josias
Souza)
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