Juiz da Lava-Jato decreta bloqueio de até R$ 60 milhões das contas de suspeitos detidos pela PF
Presidente da Eletronuclear,
afastado do cargo, teria recebido R$ 5,3 milhões em propinas de construtoras e
empresas de fachada
SÃO PAULO — O juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal Criminal do Paraná, decretou o bloqueio de até R$ 60 milhões das contas de Othon Luiz Pinheiro da Silva, presidente licenciado da Eletronuclear, e de Flávio David Barra, executivo da Andrade Gutierrez, presos nesta terça-feira na 16ª fase da Operação Lava-Jato. Também foi realizado o bloqueio nas contas da Aratec Engenharia Consultoria & Representações Ltda, pertencente a Othon. Em cada uma das contas o bloqueio foi de R$ 20 milhões. Somente na Aratec, o valor recebido em propinas seria de R$ 5,3 milhões, de acordo com a Justiça do Paraná.
Moro diz que o confisco dos bens
é justificado porque o esquema criminoso, organizado em torno do presidente
licenciado da Eletronuclear, “gerou ganhos ilícitos às empreiteiras (Andrade
Gutierrez e Engevix) e aos investigados, justificando-se a medida de privá-los
do produto de suas atividades criminosas”. O juiz da Lava-Jato determinou a
prisão preventiva de Othon e de Flávio com base na investigação de que os dois
teriam recebido propinas pagas pela Aratec no valor de R$
4,509 mihões, provenientes da Andrade Gutierrez e Engevix, no período de 2009 a
2014.
O resto do montante pago a Aratec
foi de outras grandes empreiteiras, além de empreiteiras de fachada. A OAS
teria pago R$ 504,2 mil, entre 2007 a 2015; a UTC, R$ 101 mil; a Camargo
Corrêa, R$ 109,1 mil; e a Techint, outros R$ 161,2 mil. Empresas de fachada
teriam sido usadas para o repasse de propinas à Aratec no valor de R$ 5,385
milhões. Ainda segundo o juiz da Lava-Jato, as empresas de fachada não tinham
funcionários ou suporte para prestar qualquer tipo de serviço.
A CG Consultoria, Construções e
Representação Comercial Eireli recebeu, entre 2009 e 2012, um total de R$ 2,9
milhões da Andrade Gutierrez, mas transferiu R$ 2,699 milhões desse total para
a Aratec entre 2009 e 2014. A JNobre Engenharia e Consultoria depositou R$
792,5 mil na conta da Aratec entre 2012 e 2013, no período em que recebeu R$
1,4 milhão da Andrade. A Deustchebras depositou R$ 252,3 mil para a Aratec. Já
a Link Projetos e Participações depositou R$ 765 mil para a empresa de Othon.
EMPRESA COM UM FUNCIONÁRIO
Entre setembro de 2000 e
fevereiro de 2015, Othon foi sócio com 99% de participação da Aratec, com sede
em Barueri, na Grande São Paulo. O quadro social da empresa é composto também
pelas duas filhas de Othon, Ana Cristina da Silva Toniolo e Ana Luiza Barbosa
da Silva Bolognani, que substituiu o pai a partir de 25 de fevereiro deste ano.
Antes de 2012, a Aratec não tinha empregados registrados. De 2013 a 2014, tinha
apenas um funcionário. O GLOBO visitou o endereço apontado como sede da
empresa, em Alphaville (Barueri-SP). Não havia ninguém. Othon deve ficar preso
5 dias em Curitiba.
Nesse período em que recebeu as
propinas, Othon ainda estava no cargo de presidente da Eletronuclear. O
empresário só se licenciou no dia 29 de abril de 2015, após notícias da
Operação da Lava-Jato sobre o seu envolvimento no esquema de corrupção na
estatal, dirigida por ele desde 2005.
“A medida é menos gravosa aos
investigados e propiciará, com a realização das diligências, que esclareçam os
fatos e eventualmente infirmem as provas, em cognição sumária, de que a Andrade
Gutierrez e outras empresas teriam repassado propina, indiretamente, a Othon
Luiz mediante empresas intermediadoras e simulação de contratos de prestação de
serviços”, disse Moro em seu despacho, acrescentando que há “prova relevante de
crimes de fraude a licitações, corrupção e lavagem de dinheiro”.
De acordo com o juiz, além de
participar do consórcio Agramon para a Construção de Angra 3, a Andrade
Gutierrez “mantém relações antigas com a Eletronuclear em outros contratos”.
Apenas em setembro de 2009, a Andrade e a Eletronuclear celebraram o aditamento
de contrato de obras de construção civil de Angra 3 no valor de R$ 1,2 bilhão.
Pela Eletronuclear assinou Othon Luiz, enquanto que pela Andrade Gutierrez
assinou Clovis Renato Numa Peixoto Primo, que nesta terça-feira foi levado à
Polícia Federal para prestar depoimento. Já a Engevix recebeu a Eletronuclear,
entre 2011 a 2013, a mando de Othon Luiz, um total de R$ 122,9 milhões.
“Do quadro probatório,
concluiu-se pela presença de prova de que empreiteiras com contratos com a
Eletronuclear, dirigida por Othon Luiz, efetuaram transferências milionárias,
entre 2009 a 2015 na contra da Aratec Engenharia, de propriedade e controlada
pelo próprio Othon Luiz”, escreve o juiz em seu despacho.
O juiz não vê como justificar os
pagamentos à Aratec.
“Sob qualquer aspecto, parecer
difícil justificar de forma lícita o recebimento pela Aratec Engenharia e, por
conseguinte, por Otohn Luiz, de pagamentos milionários de empreiteiras que, ao
mesmo tempo, mantinham contratos com a Eletronuclear, empresa estatal por ele
dirigida. Mais ainda difícil de justificar a utilização para essas
transferências de empresas intermediárias, algumas com características de serem
de fachada”, diz o texto de Moro.
Os nomes de Othon Luiz e Flávio
David Barra foram delatados por Dalton Avancini, ex-presidente da Camargo
Corrêa, que também participou do cartel montado para obter as obras de Angra 3.
Avancini disse ao juiz em delação premiada que houve pagamentos de propinas a
Othon até o segundo semestre de 2014, quando as investigações da Lava-Jato já
haviam “se tornado notórias”. Para o juiz, há ainda “fundada suspeita de que o
esquema criminosa vai muito além da Petrobras e Eletronuclear”.
“O mesmo Dalton Avancini também
revelou acordos de pagamentos de propina envolvendo a Camargo Corrêa, a Andrade
Gutierrez e a Odebrecht nos contratos de construção da Hidrelétrica de Belo
Monte”.
Segundo o juiz, “há, portanto,
vários elementos probatórios que apontam para um quadro de corrupção sistêmica,
nos quais ajustes fraudulentos para obtenção de contratos públicos e o
pagamento de propinas a agentes públicos, bem como o recebimento delas por
estes, passaram a ser pagas como rotina e encaradas pelos participantes como a
regra do jogo, algo natural e não anormal”.
Engevix e Andrade Gutierrez
informaram que colaboram com a apuração.
(O Globo)
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